No dia 20 de dezembro de 2024, Roberta Moema Sodré, pesquisadora do Gedai, defendeu sua dissertação de mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Pará (PPGL/UFPA). A dissertação foi nomeada “Pedreira: memórias de/em um bairro negro” e a banca de defesa foi presidida pela profa. Dra Ivânia dos Santos Neves (PPGL/UFPA) e teve como arguidoras a profa. Dra. Luciana de Oliveira (UFMG) e a prof. Dr. Rodrigo Correa Diniz Peixoto (PPGSA/UFPA).
A pesquisa ganha corpo a partir da colaboração das discussões realizadas no grupo gedai e das vivências da pesquisadora como sujeita negra em movimento. Assim, Roberta propõe a “Metodologia Sankófica”, que simboliza a busca pelo passado para compreender o presente. A pesquisa analisa as memórias que atravessam o bairro Pedreira, com o objetivo de visibilizar como os discursos contracoloniais de matrizes culturais africanas estão presentes na constituição e nas memórias do bairro da Pedreira, em Belém – PA.
A partir daí surge o questionamento: como a linguagem pode ser pensada e configurada a partir do espaço de um bairro que recebeu o título de “Bairro do Samba e do Amor”?
O colonizador impôs um sistema de escrita colonial aos povos colonizados, desconsiderando outros sistemas linguísticos, que não se encaixavam no padrão europeu. Os antepassados africanos deixaram sua marca, sua escrita, impressa na arquitetura dos bairros, nas formas que compõem o espaço urbano e nas práticas cotidianas. Essa não é uma simples visualidade, mas uma filosofia profunda que carrega em si um sistema linguístico tão poderoso e complexo quanto os dos povos indígenas. Essa escrita não se limita ao papel, mas se espalha pelos corpos, pelas paredes, nos gestos, movimentos, etc. Para os europeus, que os consideravam como desprovidos de saber, não era possível compreender o potencial de um corpo que carrega saberes ancestrais, e que, hoje, resistem na luta pela afirmação da história e da memória, em face da governabilidade colonial, com suas políticas de opressão empreendidas ao longo da história.
Entre as estratégias empreendidas pelo dispositivo colonial para apagar a memória do povo negro, destaca-se a atuação dos jesuítas, que, em suas missões, desempenharam um papel crucial na tentativa de cristianizar os africanos, forçando uma ruptura com suas práticas culturais e espirituais.
No entanto, as estratégias de resistência nunca foram totalmente silenciadas. O povo negro, sequestrado de África, chegou a Mairi, terra de Maíra, localizado no litoral do Amapá, Pará e Maranhão, foi recebido pelos povos indígenas. Dessa forma, iniciou-se a construção do que ela vem chamar de “Mairi Negra”. Esse processo não ocorreu de maneira isolada, ao contrário, ele se deu por meio de uma colaboração entre comunidades indígenas e negras. Este território, que se localiza através do contato e colaboração das duas raças, que estavam sendo escravizadas,é uma materialidade que visibiliza como, na confluência entre esses dois povos, a resistência se manteve.
A convivência entre esses dois povos criou uma possibilidade de fortalecimento das resistências, com os indígenas acolhendo a cultura negra e, ao mesmo tempo, com o povo negro preservando e transmitindo suas práticas culturais, especialmente nos terreiro. Nesses espaços sagrados, a memória ancestral era preservada, e o batuque- o toque do tambor, tornou-se um dos maiores símbolos de resistência. O batida do tambor saí dos espaços de terreiro e migra também para as escolas de samba, em especial pela atuação dos ogãs nesses outros espaços. Não o era apenas uma forma de música, mas uma forma de manter viva a tradição através do batuque do tambor.
A Pedreira não seria o bairro do samba e do amor se a memória não estivesse viva no corpo dos sujeitos. A pesquisa desenvolvida é comprometida com a memória e história do povo negro e traz importantes reflexões sobre a constituição da cidade de Belém- PA a partir das heranças deixadas pelos africanos que aqui chegaram.
